Como um fim-de-semana de Outono

Os meus fins-de-semana de Outono cheiram a chá e sabem a mantas de sofá. Cheiram a marmelada e a compotas bem apuradas, com paciência... Sabem a troca de chinelos, a troca de havaianas pelos chinelos quentes de quarto, e a pijamas que são mudados sem que o mau cheiro o justifique.
Há uma noite em que não se dorme. Em que se tem frio de todas as maneiras e em que me tenho que levantar para reforçar o aconchego, o ninho, o buraco onde são feitos os sonhos. A fábrica de sonhos!
Aqui e ali ainda se encontram vestígios de Verão na roupa amontoada à espera de companhia para iniciar uma viagem até ao mundo subaquático, altamente perfumado, de uma máquina de levar... De onde em onde encontro vestígios do Verão na roupa que espera, ansiosamente na pilha da roupa lavada (por passar a ferro), uma decisão de fim de estação. De fim de esperança, de fim de calor, de início de tudo o que está arrumado em caixas.
Parece fácil, todo este processo. Basta tirar e pôr coisas. Os sítios são os mesmos. A verdade é que este processo estende-se, normalmente, até ser incomportável. Até parecer mal trazer camisolinhas de alça no cesto da roupa ou nalguma cadeira à espera da coragem para regressarem ao local que as alberga durante longos 6 meses (por aí...), até esbarrar contra uma destas peças de roupa (ou de calçado) e pensar: Ui, de repente congelou-se-me a alma.

Arrasto todo este ritual até não ter a mínima hipótese de sucumbir à fraqueza de aceitar que o Outono, para mim, não passa de um fim-de-semana de sol que aquece mais que um de Verão. Aceito, finalmente, que no Outono a minha quietude, solidão e queda de cabelo, trazem consigo livros, calor de braços e cabelo novo já a crescer. Trazem, também, roupa linda que tenho num outro armário à espera da sua hora.

Trazem chá.
Biscoitos que não perdem a validade, esquecidos nas prateleiras.

Até lá, vou tratando de preparar a hibernação dos vestidos e das sandálias. Esta preparação requer paciência e muita ardileza. Tenho que os convencer de que, na próxima Primavera, ainda cá estou.


Gustav Klimt - Tree of life


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