Sinais do tempo

Não encontro melhor coisa a fazer a um domingo de chuva senão observar. Tudo o que consigo ver.
Casas de campo deixam de ostentar o seu exterior cuidado, passando a viver silenciosamente na incerteza de alguém, algum dia, voltar a sentir-se em casa.
As árvores de fruto evidenciam um desmazelo tal que, nesta altura de nudez, nos faz indagar sobre a imensa capacidade da Natureza em existir. As videiras apresentam-se como tufos de cabelo eriçado cuja solução é apenas uma: o corte.
Sacodem-se toalhas do almoço de família e vê-se um pai com uma criança a passear no jardim, esquecido daquilo que já foi. Tenta replicar a magia que outrora aquele local possuiu mas sem efeito: a mãe chega ao alpendre e chama-os para dentro. Tinha recomeçado a chover.
A criança que viveu naquele jardim teima em ficar. Olha em redor e os seus olhos espelham o desejo de voltar com mais tempo para cuidar do jardim e do quintal. Talvez espelhem um regresso definitivo mas eu só lhes consigo reconhecer a vontade de dar vida àquilo que já viveu.
Em muitos olhares se reconhece este retorno. Esta vontade infinita de não deixar aquilo que plantámos. O regresso a casa.
Contudo, o regresso a casa é uma aventura. É um reaprender. 
É um regresso a casa, no caso de um casal, para apenas um deles. E há muita gente que não consegue ver beleza nestes regressos. Nem sequer conseguem regressar "a meias": tem apenas que se viver o que se começou. No tempo que é o de hoje. Como começou. Não o de há vinte anos atrás...

Desfazem-se nós, deixa-se as pessoas existir (como a Natureza), partem-se corações. Saudades sem morte à vista, que marcam avós, filhos e netos.
Saudades de um lugar que deixou de ser o meu. Saudades de um lugar que eu desejaria "ser" um dia. Saudades de um lugar que desconheço, mas que gostaria de vir a conhecer...


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