Enquanto era suposto dormir

Já há muito que não escrevia.
Não me faltou vontade mas sim coragem. Na grande maioria das vezes são mais importantes os silêncios que os ruídos. A ver se nos encontramos...

Ora, não desisti de mim nem dos outros.
Mas cansei-me. Sinto-me esgotada.
Tornei-me numa pessoa insuportável pois já nem consigo ouvir algumas pessoas a começar a falar, sequer! Nem tampouco tolerá-las por curtos períodos de tempo. Aquelas que tudo fazem. Que, resultado final, é nada. Aquelas que sugam tudo o que as rodeia porque se esquecem que do outro lado existe alguém.

Todo este silêncio e vivência que tive de há um ano, aproximadamente, até à data serviram essencialmente para perceber que há fronteiras/limites que têm que ser definidos. Não mais! à loucura da dádiva gratuita e permanente. Não. Porque dizer não é muito importante.

Acredito na teoria "favores em cadeia". Tudo o que damos é-nos devolvido em dobro.
Nem sempre. Nem nunca.

Aprendi neste ano que me negligencio constantemente. Que faço mal a mim mesma por querer sempre estar para os outros e nunca para mim, para aquilo que é bom para mim, importante para mim. Sem espaço. Lugar para ser e para existir.
Foi preciso o confronto com a linha ténue que separa a juventude e a eternidade dos seres mortais e efémeros que somos para perceber que, de alguma forma, isto teria que parar. Como dizia esta semana ao meu "chefe", como carinhosamente lhe chamo, que por sinal é a figura mais próxima de pai que possuo de há uns anos para cá, sempre que somos confrontados com verdadeiros acontecimentos que nos abalam os alicerces nós tornamo-nos no ciclista em fuga. Já não conseguimos acompanhar os demais.

Prometi que iria fazer algo por mim de ora em diante.
Até hoje, posso dizer que pouco fiz em relação a isto. Tomei algumas decisões importantes, arrojadas, desfiz-me de planos que em tempo fizeram sentido, defini novos objectivos, metas, abri horizontes. Acredito. Pelo menos, quero acreditar.
Sei que a vontade não chega. Temos que deixar de sentir as coisas para as deixar ir. Ou continuar a sofrer com e por elas. Escolher continuar.

E sobre continuar, a minha mãe nunca para de me ensinar e educar. Com setenta e sete anos sofreu uma desilusão por parte de uma das suas amizades. Ela, que é toda activa e que se defende tão mas tão bem, calou-se e ficou sem reacção. Veio para casa lamber as feridas. Com um tal murro no estômago. Eu só lhe dizia "ah, vá, não se admire que isto é o pão nosso de cada dia". E ela continuava incrédula. Umas semanas após fui de visita e reparei que a relação existe. Com a mesma dinâmica. O mesmo sugar, dependência, o que for. A mesma dinâmica.
Escolheram continuar, embora saiba que a minha mãe continuou com outra percepção, outra consciência: a de que nem toda a gente respeita aquilo que os outros são para elas. A consciência de que a verdadeira dádiva e entrega se dá quando existe esta noção de que o fluxo de transacção de emoções, sentimentos, energias nunca será equilibrado. Existe sempre alguém que dá mais. E, quando não existem expectativas, é-se mais feliz.

Não é fácil viver sem expectativas. Somos seres sociais, interagimos, criamos expectativas e vivemos dependentes delas. Por vezes os melhores abraços vêm de quem menos esperamos, quando não os queremos, quando não os procuramos. As melhores noites são aquelas que não planeamos, que levamos a roupa de trabalho e que encontramos quem não esperávamos encontrar. As expectativas!

E há dias em que deixamos as expectativas de lado e nos cai no colo um reconhecimento em forma de rebuçado, um telefonema do outro lado do mundo com saudades, um abraço sentido.
E o mundo pula e avança. Sempre na mesma direcção.

E eu penso "nunca conseguirei mudar a minha verdadeira essência".
Deixarei para trás as coisas que tiver que deixar, quando tiver que deixar.
Esperarei sempre dos outros o mínimo de decência e respeito pela pessoa que sou. Por tudo aquilo que sou.
Terei expectativas.
Não darei a devida importância a quem não tiver que dar: terei dois pesos e duas medidas. Porque as missões e as pessoas não possuem a mesma importância na minha vida. Cada uma ocupa o seu lugar. Poderei cair trinta vezes por uma enquanto que por outra cairei meia. Terei dois pesos e duas medidas.
No entanto, tentarei sempre honrar a promessa que fiz a mim mesma em como não me permitirei atolar. Estagnar. Aparvalhar e deixar-me absorver por coisas/pessoas verdadeiramente tóxicas. Que retiram diariamente. Sem nada acrescentar.

Digo não à toxicidade que me impregnou o corpo e a alma anos a fio.
Irra.
Já chega.

Comentários

Melissa disse…
minha amiga que força para escrever tudo isto!
também tenho vindo a viver nesta linha de me auto-centrar depois de passar anos a dar dar dar e depois sentir-me também esgotada.
Temos de pensar em nós em primeiro lugar, não numa atitude egoísta mas de Amor próprio.
Amando-nos amamos os demais com a medida justa. Só e basta.
és uma pessoa muito importante na minha vida!
Adoro-te!
Melissa

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